Outro trago era tudo que lhes restava. Mais um. Viciados em solidão, compartilhavam a cura passageira no mesmo copo. A sorte derradeira era poder enxugar o suor dos copos e das almas no mesmo pano aos domingos. Não tinham mais planos, mas muitos sonhos adormecidos pelo tempo eram sempre assunto naquela mesa: filhos, jogo do bicho, Opala preto, final de campeonato, Salvador, comida mineira, show do Roberto Carlos, casa, festa de aniversário… Sonhar era quase um castigo.
Mês: fevereiro 2015
Era carnaval. Já ousava amanhecer. Ele anoiteceu na farra e ainda esperava por um amor – ainda que fosse desses de carnaval, anônimo e perecível, não mais surpreendente do que um desfile. Da concentração dos blocos à dispersão do porre, sentiu seu amor passar tão perto quanto o som da bateria que eclodia no seu peito, mas não o encontrou. Desfilou vaga e solitariamente embriagado de tédio. Triste foi do Paraíso à Consolação. Nem era quarta-feira quando entrou no coletivo lotado – como se ainda estivesse num bloco – e sumiu.